A ministra Ideli Salvatti, coordenadora política de Dilma Rousseff, reuniu-se a portas fechadas com os líderes do PT e do PMDB. Longe dos refletores, tentou explicar o rumoroso caso das lanchas adquiridas pelo Ministério da Pesca.
Ideli disse que a compra de 28 embarcações, feita em processo apinhado de irregularidades, foi feita antes da chegada dela na pasta da Pesca. Coisa do antecessor petista Altemir Gregolim.
As lanchas custaram ao Tesouro R$ 31
milhões. Auditoria do TCU descobriu que 23 das 28 embarcações encontravam-se paradas, em vias de virar sucata. Detectaram-se, de resto, indícios de superfaturamento, pagamentos antecipados, serviços não realizados e aditivos contratuais suspeitos.
Ideli não negou os malfeitos. Preocupou-se apenas em tomar distância deles. Insinuou que, se alguém deve explicações, não é ela. Tentou dissociar-se também do desdobramento do episódio: a doação eleitoral de R$ 150
mil feita ao PT catarinense pelo fabricante das lanchas, a empresa Intech Boating.
Na versão de Ideli, a doação foi feita ao partido sem a interferência direta dela. Reconhece que a verba foi repassada ao comitê de sua campanha ao governo de Santa Catarina, em 2010. Mas sustenta que não partiu dela a solicitação.
Derrotada nas urnas, Ideli foi acomodada por Dilma na poltrona de Ministra da Pesca. Nessa função, mandou pagar a última parcela das lanchas. Coisa de R$ 5,2 milhões. Alega que apenas liquidou uma fatura contratada na gestão anterior.
Ouviram Ideli: os líderes do PMDB Henrique Eduardo Alves e Renan Calheiros, os líderes do PT Jilmar Tatto e Walter Pinheiro e os líderes do governo na Câmara, no Senado e no Congresso, respectivamente Arlindo Chinaglia (PT), Eduardo Braga (PMDB) e José Pimentel (PT).
A repórter Marta Salomon veicula
notícia que indica que as explicações de Ideli aos líderes devem ser levadas em conta apenas até certo ponto. O ponto de interrogação. Identificou-se o petista que pediu a contribuição financeira ao fornecedor das lanchas do Ministério da Pesca.
Chama-se Karim Bacha (foto ao lado). Respondia na época pela secretaria de Planejamento da Pesca. Em setembro de 2010, dividia-se entre as atribuições do ministério e o engajamento na campanha de Ideli.
Ouvido sobre a mordida em José Antônio Galízio Neto, o dono da Intech Boating, Bacha declarou: “Durante o processo eleitoral, acabamos conversando com muitas pessoas. Eu posso ter conversado com o Neto também. Não vou dizer que não, porque faz tanto tempo.”
Dono de memória mais atilada que a de Bacha, o empresário José Neto soou peremptório: “Tive contato com ele, sim. Foi mais ou menos uma semana, dez dias antes de eu fazer a doação, uma coisa assim. No meio da campanha, próximo das eleições, foi solicitado que a gente… bem, o resto você já sabe.”
De acordo com os registros do TSE, os R$ 150 mil da Intech Boating pingaram nas arcas do PT catarinense em 13 de agosto de 2010. O partido bancou 81% dos custos da campanha de Ideli. Em reais: R$ 2,9 milhões. Na semana passada, José Neto já havia reconhecido que contribuiu com o PT “a pedido” do Ministério da Pesca.
Quer dizer: a ordem para a compra das lanchas inservíveis partiu do ex-ministro Gregolim, petista como Ideli, catarinense como ela. Cuidou da captação eleitoral o petista Bacha, engajado na campanha de Ideli. Nomeada ministra, Ideli mandou pagar a derradeira fatura ao fornecedor. Mas Ideli não tem nada a ver com o peixe.
Aos líderes, a coordenadora política de Dilma afirmou que, se tivesse migrado da campanha de 2010 direto para a pasta das Relações Institucionais, sem fazer escala na Pesca, ninguém estaria invocando a participação dela na encrenca. Será? “Não é problema meu”, disse Ideli. “Se alguém tem que explicar, não sou eu.”
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